...palavras são o que teimamos em usar para vesti-las.

terça-feira, 22 de outubro de 2013

Enquanto você dorme - Parte 1 

Esperei você por quase 5 anos. Não estive sentada este tempo todo, balançando os pezinhos impaciente como você agora há pouco no cadeirão, esperando o seu almoço. Não, não foi bem assim. Durante este tempo todo, estive fazendo muitas outras coisas, é verdade. Porém, a espera pela sua chegada me passou pela mente em cada um destes muitos dias, fosse à noite na hora de dormir, fosse ao ver uma criança pequenininha como você brincando na rua, fosse ao ver um casal de passarinhos fazendo um ninho, à espera de seus filhotinhos. Você foi por mim gestada à distância, não bem na minha barriga, mas no mundo das ideias, que é um outro tipo de barriga onde digerimos os pensamentos e os desejos. Te idealizei devagarzinho, de muitas formas, imaginei os seus olhos, pensei em como seria erguer o seu peso nos meus braços, braços que ficaram por tanto tempo vazios, ou ocupados com pesos menos importantes. Sim, muitas coisas aconteceram antes de você chegar, mas todas essas coisas foram muito, muito menos importantes do que você, do que o seu sorriso ou o seu soninho gostoso, exatamente como este que você está tirando ali no quarto ao lado, enquanto escrevo esta cartinha.

Os últimos meses da espera, esses sim foram os difíceis. É como quando a gente tem vontade de fazer xixi, e a vontade aperta muito conforme vamos chegando cada vez mais perto do banheiro. A espera vai se tornando quase insuportável, e parece que não vamos mais aguentar segurar. Nestes dias, chorei sozinha de vez em quando, assim como você chora agora, quando não aguenta mais esperar que a gente coloque a sua bicicletinha no chão, para você poder sentar nela e sair andando com os pezinhos alegres no chão. Mas a hora certa chegou, e você finalmente apareceu. Agora são os meus pezinhos que não querem parar de correr, alegres, atrás de você!

De tudo o que me contaram sobre o momento da chegada de um filho, o mais maravilhoso ninguém me disse. Ser escolhida como mãe é a coisa mais emocionante que pode acontecer a alguém. O seu olhar profundo, sério e sem desviar dos nossos olhos, por um longo tempo, logo no primeiro dia em que nos conhecemos, nos dizia quem você era, e buscava no fundo da nossa alma a confirmação de quem éramos mesmo nós. Chegamos a ficar com medo, ninguém nunca tinha nos olhado assim. E no dia seguinte, a confirmação de que você já havia feito a sua decisão. Um “mamãe” espontâneo e inesperado, e o seu relato para quem quisesse ouvir dizendo “segô, segô”: o papai e a mamãe haviam chegado, e você queria avisar todo mundo!

Enquanto você dorme, ali no quarto ao lado, penso aqui que nos conhecemos há apenas 20 dias. Penso como é possível que você já acorde de noite chamando por mim, que não deixe um minuto de verificar onde estou, que se agarre à minha perna na cozinha enquanto lavo a louça fazendo gracinha, como eu fazia coma minha mãe e, mais importante, que me confie completamente a sua vidinha, com tanta certeza. Quando você ergue os bracinhos e pede colo, é como se você soubesse bem mais do que nós sabemos sobre as coisas da vida, ou como se você estivesse sempre estado aqui. Deus certamente suspirou no seu ouvidinho, que você pode de fato ficar sossegada: nossos caminhos estiveram separados por dois anos, é verdade, mas finalmente se encontraram, e daqui para a frente não se separam nunca mais. Pode continuar dormindo tranquila, nossa querida Giovanna.