Alguma vez você já se sentiu pequenininho? Não vale pensar em quando você era criança, mesmo porque, embora pequeno em estatura aposto que você se sentia grande o suficiente para subir naquele muro, ir sozinho naquele lugar, ou chegar tarde daquela festa. Quero dizer pequenininho em um sentido não tão óbvio, pequeninho por dentro, com pouco a oferecer, ou muito para aprender, como queira.
O engraçado, é que, às vezes, tanta gente nos vê grandes, enquanto nós sabemos da nossa pequeneza. Só a gente tem consciência do que nos falta ainda saber. E sabemos que talvez haja ainda mais.
É uma sensação que experimento todos os dias, em uma fase em que quase tudo é novidade. Não falo apenas do trabalho ou da língua. O contexto é outro, as pessoas nem sempre reagem da forma como esperamos, até o humor é diferente. É uma experiência única, aprender coisas tão básicas de novo. O que tem graça aqui, às vezes não tem a menor graça aí. Uma cara franzida, ou a ausência de qualquer expressão facial, pode não significar a mesma coisa que significaria aí. O tom de voz é algo que sempre me engana. Ninguém está bravo. É assim que se fala aqui. Às vezes depois de uma voz áspera, vem um melódico “tchuuus”, tão gentil que a gente até olha para trás para ver se é a mesma pessoa quem está dando tchau.
É claro que você não pode esperar entender completamente o contexto, em tão pouco tempo. Gosto de pensar que, enquanto eu assistia o Sítio do Pica-Pau Amarelo, a moça que me atendeu na loja de móveis assistia um programa completamente diferente, quando era criança. Ela nunca teve medo da Cuca, e eu nem sei o nome do bicho de quem ela tinha medo. Se soubesse, provavelmente não conseguiria pronunciar. Temos referências diferentes, não devemos necessariamente reagir da mesma forma ou rir das mesmas piadas. Como eu sou a minoria aqui, eu é que me sinto pequenininha, quando não entendo por que ela se recusou a me falar o preço do sofá às 8:57, quando o horário de atendimento começava às 9:00. Ou quando eu não encontro o leite condensado no mercado, por que ele fica junto ao café, e não junto aos ingredientes para bolos e doces (???). Ou quando a secretária do médico não me avisa que ele não atende pelo convênio, até que eu chegue lá, no dia da consulta. Some-se a isso tudo o fato que, ao aprender uma nova língua, raramente conseguimos expressar exatamente o que gostaríamos, o que dá ainda mais margem para confusão.
A sensação de que voltamos a ser pequenos aparece também quando passamos a precisar de ajuda para aquilo que antes fazíamos sozinhos, com os pés nas costas. Todo mundo que já precisou de ajuda para tomar banho, depois de quebrar o braço ou fazer uma cirurgia, por exemplo, conhece a sensação. É um aprendizado, conseguir se livrar do orgulho e da falsa sensação de autossuficiência. Até tentei ligar sozinha para o setor de achados e perdidos da companhia de metrô (sim, sim, esqueci minha bolsa no trem, já sei preciso prestar mais atenção nas coisas). Suei mais do que se tivesse feito 30 minutos de esteira. Valeu o treino, mas tudo ficou mais fácil quando uma boa alma germânica que passava por ali resolveu me ajudar com a comunicação.
Enfim, daqui de baixo da minha pequeneza de hoje, sinto que há tanto por aprender. Às vezes dá até uma impressão de que não vai dar pé, que a piscina é muito funda para a minha estatura. Já aprendi a nadar uma vez, acho que é possível aprender a nadar por aqui também. Por enquanto, é paciência de gente grande, e mão na bordinha...
Oi, Déa!
ResponderExcluirPutz, me deu aflição. Será que subestimamos as diferenças entre as pessoas? Eu acreditava que haveria um limite para isso, afinal somos todos feitos da mesma matéria. Talvez o limite esteja, então, além do imaginado. Talvez gostaríamos que os outros dedicassem a nós o mesmo esforço que fazemos para estarmos minimamente inseridos no contexto. Sem dedicação e muita, muita, muita boa vontade é capaz de surgir um abismo entre todos. Tenho certeza que você vai alcançar os pés no fundo e sair nadando. Por enquanto coloque aquelas "boinhas" nos braços...
Beijos!
Andrea,
ResponderExcluirUma vez eu ouvi um padre dizendo que as vezes "é preciso nos fazermos pequenos para entendermos quem realmente nós somos e lebrarmos de nossas raízes", tá ai essa é você recomeçando. Força e parece que não, mas no Brasil vocês vão estranhar também, a partir desta experiência. Nosso cérebro aprende rápido demais. Agente aprende a se acostumar e o pior é que aprendemos a gostar também...quem sabe?!
Um beijão.
Saudades.
Priscila Marchello