Já reparou como gastamos boa parte do nosso tempo pensando em coisas que sequer existem? O amanhã é um bom exemplo. Olhe aí para o seu relógio. Até a meia noite de hoje, o amanhã simplesmente não existe. Não se trata de discutir se ele existirá ou não, com aquela velha conversa de que “basta atravessar a rua...”. Nada disso. A questão se limita aos fatos. Neste momento, ele não existe. Ponto final.
Então, por que será que nos dedicamos tanto a imaginar como ele será? E pior, quando o amanhã finalmente chega, lá estamos nós pensando no dia seguinte, e seguinte, numa interminável especulação sobre o que vem por aí. Parece um mal bastante comum, tanto é que garante o sustento de um bando de profissionais, de economistas a meteorologistas, para não falar nos praticantes de modalidades menos respeitadas de adivinhação. Mas parece que nem sempre fomos assim, ao menos, não quando éramos crianças.
Neste último feriado, o Léo – aquele mesmo, o do leão – voltou à nossa casa. Do dia em que ele chegou, até o dia em que o levamos embora, eu só conseguia pensar em como será a vidinha dele, dependendo do que o juiz vai decidir (quando V. Excelência decidir decidir, é claro).
Será que o Léo um dia vai se formar na faculdade, ou vai largar a escola cedo? Será que ele vai se lembrar que é feio pegar sem pedir emprestado, ou vai se render aos conselhos das más-companhias? Será que ele vai esquecer a sensação de abandono que experimenta desde tão pequenininho, ou vai transformá-la em revolta, em algum ponto do caminho?
Já ele... quanta preocupação! Se deliciou com a água gelada no rasinho da praia, comeu tantos danoninhos quanto pôde, assistiu mais uma vez o seu filme preferido na televisão, dormiu no nosso colo no sofá, fez birra para ir para a cama. Viveu aqueles 4 dias intensamente, sem pensar no domingo que estava chegando. Sem pensar nos meses e anos incertos que estão por vir. Sábia decisão: afinal de contas, o que pode ele em relação ao seu futuro, do alto do seu 1 metro de estatura?
Tentei ensinar o Léo a amarrar o cadarço do próprio tênis. Ele me olhou fixamente, com a testa bem franzida, e as palmas das duas mãozinhas viradas para cima, em sinal de completa indignação:
“Mas, tia, eu só tenho 4 anos!”
Boa Léo! Às vezes falta a nós, adultos, reconhecermos a nossa pequeneza e impotência diante dos fatos da vida. Quer saber? Façamos a nossa parte hoje, e que venha o amanhã, como tiver de ser. Eu vou é imitar o menino, e comer meu danoninho sossegada, um dia de cada vez.