Agatha, não tem como eu deixar o
dia de hoje acabar sem pendurar nesta tela em branco do computador as palavras
que andam rodando na minha cabeça há algumas semanas, soltas, querendo ser
registradas para o dia em que você puder entender. Foram sete meses de convívio
absolutamente intenso com você. Muitas vezes cercadas pela nossa família, que te
ama tão loucamente quanto eu, mas também tantas vezes só nós duas. Aqui na
nossa casa, na rotininha que o seu status de bebê requer, entre banhos,
mamadeiras e passeios no sol, nesta pausa maravilhosa que a vida me concedeu
para te conhecer e receber os presentes que você me trouxe, não sem bem de onde,
com a calma e o tempo que eles merecem.
Lembrar como é sentir o amor puro
de verdade, com total intensidade e sem receio de entrega, foi o milagre que
você fez em mim. Atendi ao convite dos seus olhos enormes, para um contato
intenso e profundo, que diariamente foi me trazendo de volta, me resgatando e
resgatando minha esperança de me encantar novamente com o mundo, uma parte da
inocência que eu tinha largado por aí nas curvas pelas quais a vida às vezes
nos leva.
Vi seu sorriso imenso e gostoso, aquele
mesmo que você nos ofereceu de graça logo no primeiro dia em que nos conhecemos,
ainda banguela, ir ganhando o recheio de dentinhos, desde o primeiro até o nono, que despontou aí outro dia, não te deixando dormir à noite de
febre e incômodo. Vi você começar a engatinhar como uma lagartinha em cima da
cama, depois rápida com os joelhos coordenados no chão, e logo estava se
apoiando para ver de pé o que tinha em cima do banco. Torcemos pelo seu
primeiro passinho com mãos dadas, depois sozinha, e agora te vejo passar
correndo de lá para cá no corredor, ainda meio cambaleante, mas determinada, enquanto
guardo na cozinha tudo o que você tirou das gavetas enquanto eu cozinhava.
Vi você fazer caretinha com a
boca toda suja de feijão preto, fazer bagunça na banheira, puxar, impune, tufos
de pêlos do cachorro. Aprender a gostar de dormir no seu berço, que no início
parecia ter espinhos, e onde agora você deita tranquila, enfiando a cabecinha
nas almofadas, depois de balançar o bumbum e abraçar o seu coelho Godofredo. Vi
você se arriscar nas suas primeiras pseudo-palavras, que por enquanto se
resumem a três: “papapo” (termo multi-propósito que serve tanto para “sapato”, “sapo”
quanto para “macaco”), “pu-pu” (vulgo “piu-piu”, mas que além de aves abarca
tudo o que vôa, incluindo borboletas, mosquitos e pipas), e “não” (este último termo
de uso intensivo, dispensando explicações). Vi você conquistar a sua irmã logo no primeiro
olhar, irritá-la com a sua baba nos brinquedos e seu choro nervoso, e logo
depois voltar a fazê-la te amar com o seu abraço aconchegante, sempre
acompanhado de uns tapinhas nas costas, das suas mãos gorduchas.
Virei nestes tempos uma pessoa ainda
mais aficionada por fotografar, filmar e gravar tudo o que você e a sua irmã fazem,
falam, vestem. É uma chatice mesmo, uma fixação paranoica. Parece que se eu
não fotografar, o momento não aconteceu. Certamente um desvio grave, vindo do
meu subconsciente que quer vencer o decurso do tempo, aprisionando estes
momentos simples para sempre, ainda que seja na memória do celular, no hardware
do laptop, na página do photo-book que eu insisto em mandar imprimir. Desse
jeito, a minha licença maternidade não acaba. Vocês não crescem. Sua risadinha
continua assim inocente e abundante para sempre. E seus olhos continuam
querendo para sempre buscar a minha alma, lá dentro de mim.
Amanhã não vai ter jeito, Ágatha.
Vou voltar para o trabalho para valer, e te ver pouquinhas horas do dia, ao
invés de o dia todo, como eu e você estamos acostumadas. Já te expliquei lá no
seu bercinho, agora há pouco, e você, de novo me deu um presente, ao ouvir tudo
me olhando e no fim dizer “tá”. Claro que pode ter sido uma sílaba solta dessas
que você cantarola comigo no banheiro sem parar. Qualquer um diria isto. Mas eu
creio que foi você me confortando e me lembrando que TÁ tudo bem. TÁ tudo ótimo.
Você TÁ aqui. Você é a TATATÁ (AgaTHÁ), como brincamos e você repete. E TÁ
mesmo, TATATÁ. Entre os presentes que você me trouxe, está o desejo antigo, agora amadurecido
e transformado em objetivo, determinação, de encontrar um caminho onde eu possa andar mais pertinho de você e da sua irmã, e também mais perto de mim
mesma. Vamos conseguir, TATATÁ. Pode dormir tranquila.
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