Outro dia me peguei pensando por que é que ela nos atrai tanto. Desde crianças, somos fascinados por ela. Uma colega de trabalho outro dia descrevia para outra como os seus filhos gêmeos de 5 anos todo santo dia se dirigem a ela quando chega em casa do trabalho:
- Mamãe, mamãe, tem “tupêsa” ?
Peguei a conversa pela metade, de passagem pelo corredor a caminho da impressora. Mas uma vez ouvido o tal vocábulo desconhecido, não agüentei e tive que dar uns passos para trás e perguntar de que diabos os gêmeos estavam falando, afinal?
Ela me respondeu de maneira teatral, usando a palavra exatamente como os filhos a pronunciavam, mas com gestos e expressões que não deixavam dúvida:
- Você não sabe o que é “Tupêsa”? “Tupêsa” é quando alguém faz uma coisa que a gente não espera, como dar um presente. Aí quando saca o presente a pessoa ergue os braços, faz aquela cara e grita: “Tupeeeesaa”!
Ah, sim, a delícia que é a surpresa... Realmente, a sensação é uma das melhores, talvez por isso é que os gêmeos querem experimentá-la todos os dias. A surpresa se diferencia do susto, pois é sempre uma coisa boa. Ninguém chama de surpresa a sensação de ver um vulto na janela, de ouvir o telefone tocar de madrugada ou perceber um pedestre a um metro de distância do carro, em um instante de desatenção. Não, estes são sustos, e se encaixam em uma categoria totalmente diferente de sensação, embora também decorram de fatos inesperados.
Já o inesperado da surpresa é agradável, nos deixa perplexos de uma forma gostosa, nos deixa curiosamente felizes por não ter percebido antes o que estava para acontecer.
Mas se tem uma coisa mais gostosa do que experimentar a surpresa, é a sensação de proporcioná-la a alguém. Mesmo porque, quem surpreende vivencia a surpresa por mais tempo, durante toda fase de preparação. Há duas semanas, vinha planejando uma festa surpresa para o aniversário dos meus pais. Os dois completam 60 anos em fevereiro, um logo após o outro, com um intervalo de 1 semana. Eles jamais fizeram uma festa de verdade e, além de terem passado um ano meio difícil, achei que a data em si pedia algo especial. Ainda mais depois de ouvir a minha mãe comentar que estava com uma sensação de “dèjá vu”: quando eles ainda namoravam, ela teve de esperar 1 semana, depois do seu próprio aniversário de 18 anos, para que meu pai também completasse a tão esperada idade e os dois pudessem, finalmente, assistir a um “filme proibido” (não perguntei qual era o filme, mas em se tratando de 1968, provavelmente era algo tão escandaloso quanto Dr. Jivago). Agora, em 2010, ela se deu conta que precisará esperar a mesma 1 semana, até que meu pai complete 60 anos e possam ambos pagar meia entrada no cinema. Se isso não merece uma comemoração, então não sei mais o que merece!
Bom, comecei logo a tratar dos detalhes sem eles saberem, surrupiando os telefones das agendas, convidando os amigos em segredo, e planejando tudo mais o que uma boa festa surpresa requer. Mas como toda surpresa envolve riscos, numa noite dessas estava eu formatando o convite da festa, quando fui surpreendida por uma ligação, em tom de completa animação:
_ Filha, eu e o seu pai tivemos uma idéia!
Gelei na hora. A idéia era justamente essa que você acaba de pensar. Os dois também resolveram que esse era um aniversário especial, e pedia uma bela festa. Os planos dos sabidinhos incluía os mesmos amigos, o mesmo salão e a mesma data. Minha “tupêsa” tinha acabado de ir por água abaixo.
É claro que eu poderia usar de requintes de crueldade e dissuadi-los da idéia, dizer que dar festa é uma trabalheira, que é mil vezes melhor gastar o dinheiro em uma viagem, ou, ainda, convencer todos os amigos a recusar o segundo convite, deixando-os na decepção até o grande dia. Mas logo concluí que até o valor da surpresa tem um limite. Por mais que ela nos atraia, não tive estômago para vê-los decepcionados por várias semanas, em prol de um friozinho no mesmo estômago, na hora certa.
Estamos agora planejando a festinha em conjunto, e eles estão curtindo cada minuto. O que o singelo episódio me ensinou é que a vida, como ela se mostra a cada dia, é que é a verdadeira “tupêsa”.
Muito bom, Andréa! Me arrancou uns risos!
ResponderExcluir... e que eles curtam a tupêsa desde agora!
bêJo.